Romeu Correia ao longo da sua carreira literária nunca se livrou do epiteto de "autodidacta", que raramente era pronunciado de uma forma positiva. Em boa verdade nunca se mostrou incomodado com isso. Ele próprio fazia questão de dizer que era um produto do povo, sem nunca renegar as suas origens humildes e que "licenciaturas", só mesmo nas "Universidades do Povo de Almada".
Ao nível local esteve sempre acima das quezílias que existiram, e ainda existem, entre os "doutores" e os "autodidactas". A sua obra colocava-o num patamar superior aos dos "ditos doutos", que se dobravam e o enchiam de adjectivos e palmadinhas nas costas, para se valorizarem, como é óbvio...
Eu, felizmente tenho passado ao lado desta questão, porque embora não seja licenciado, a minha frequência universária e o curso de jornalismo do Cenjor, não tem permitido que seja qualificado de "autodidacta". Mas sempre senti que é uma grande injustiça as pessoas serem qualificadas, enquanto escritores ou poetas, pelas suas habilitações literárias e não pelo seu valor, enquanto autores. Até porque sei que há pessoas com a 4ª classe mais cultas e com melhor português que muitos doutores (sem falar no talento...).
Esta crónica deve-se também ao desabafo do meu amigo Zé do Carmo Francisco, poeta dos bons, que também não deixa de ser olhado de lado por alguns " doutos falhos" falsamente letrados, como o fulano diplomado que disse ao poeta Nicolau Saião, que escrevera uma crónica sobre a sua qualidade poética: «Não ponha esse indivíduo tão alto... ele nem é licenciado!»
É por isso que eu digo: bem hajam os "autodidactas" deste país, que têm subido a pulso a "corda da literatura", muitas vezes agarrados com todas as partes do corpo, porque é a única forma de conseguirem resistir aos muitos empurrões traiçoeiros, dados pelos pretensos "donos" deste mundo literário - que infelizmente não são tão poucos como isso...
Encerro a "Semana de Romeu Correia" com alguma polémica, mas agradado porque este grande senhor - que tive a oportunidade de conhecer -, não vai cair no esquecimento, como parece ser vontade de quem está no poder.
7 comentários:
Afinal o mundo é mais pequeno do que o que parece... fico satisfeito por ter gostado de "passear" pelo Ginjal, revivendo algumas afinidades curiosas com a Almerinda e com o Romeu.
Agradeço a sua visita e espero que volte mais vezes.
Não conheci o Romeu Correia, mas pelo tenho ouvido dizer, ele era tudo menos humilde. Tinha a pose e a mania que era um grande escritor, de renome internacional.
Além disso alinhava com os doutores, contra os "autodidactas".
O senhor Zé frisa muito bem, "tenho ouvido dizer". Eu também oiço muitas coisas, ataques pessoais cobardes, então, "são mato". É por isso que só gosto de falar do que conheço. E o Romeu Correia que conheci, era um homem simples, apesar do seu imenso valor. Sei que o facto de andar de coluna direita pelas ruas da cidade, era suficiente para alimentar todo o género de conversas. O mundo é assim...
Diz que conheceu o Romeu. Tenho as minhas dúvidas. Digo isto porque ele não era nada daquilo que você pinta.
Os meus parabéns pelo seu blogue. Destaco nele duas coisas que valorizo muito: o olhar atento e carinhoso para uma pequena parcela do território, ao qual se pode prestar um serviço inestimável, e de que os grandes meios de comunicação - tradicionais ou digitais - nunca serão capazes, e a divulgação de Romeu Correia, escritor cuja obra muito aprecio.
É lamentável que não se encontrem edições actuais de Romeu Correia. A "riqueza" bibliográfica das grandes livrarias dum dado centro comercial esconde esta miséria cultural que é o facto de o escritor que melhor retratou a terra e as suas gentes não se encontrar representado nas respectivas estantes. Pois que haja um blogue - ou muitos blogues! - que prestem a Romeu Correia a atenção que merece; e às terras e gentes que Romeu Correia amou e imortalizou, a atenção que merecem.
Tanto quanto sei, o tipo que disse isso ao Saião também não é licenciado. Embora seja um falso douto, se calhar, ou pelo menos fala com eles: é um tal Amaro, especialista em corrigir vírgulas e coisas assim.
Gostaria de felicitá-lo ,e sobretudo agradecer-lhe o carinho e a dedicação que demonstra pelo Romeu Correia.
Ele era sem dúvida um homem talentoso, de convicções fortes e dono de uma honestidade preciosa. Eu, enquanto neto dele tive o previlégio de receber a sua educação exemplar. Sinto muito a sua falta, sobretudo as histórias e as conversas inteligentes que tinhamos muitas vezes. Foi sem dúvida um dos homens mais cultos que eu tive oportunidade de conhecer.
Eu licenciado, nem por sombras me posso comparar à grandiosidade de um homem que teve a força e a coragem de aprender e evoluir sozinho. Sem diplomas, sem Mestres nem faculdades. Fazes-me muita falta, Romeu! :)
Enviar um comentário